Este é o quarto artigo que
escrevo sobre “construir a própria casa”. Como também já referi nos artigos
anteriores, estes escritos não são para ensinar ninguém a fazer uma casa, mas apenas
para ajudar ou, porque não, até para incentivar aqueles leitores que, tal como
eu, fazem do dia-a-dia uma luta diária pela sobrevivência e, por isso, todos os
cêntimos contam. Estes artigos são escritos com base na experiência obtida com
a construção da minha casa e também no meu percurso profissional na construção
civil.
Construí a minha casa
procurando sempre ser o mais economicista possível, sem descurar a segurança,
mas mais tarde verifiquei terem sido errados alguns procedimentos que usei na
construção, principalmente na parte da cobertura e que, não sendo irremediáveis,
são mais tarde de correção muito onerosa.
Depois de concluído o
levantamento das paredes e da cinta de ligação, chegou a altura de colocar o
piso de teto, para o qual utilizei vigotas de cimento pré-esforçadas e
respectiva tijoleira de material cerâmico. Este foi um dos poucos trabalhos em
tive que solicitar ajuda, devido sobretudo ao peso das vigas, que tornam esta
tarefa praticamente impossível de ser feita por uma pessoa só, tendo recorrido
a familiares e amigos.
Aspecto das cimalhas, formadas com o piso de teto. |
Como o telhado iria ser
suportado por traves, barrotes e ripas de madeira, as vigas do teto saíram para
fora das paredes, do lado dos beirais, cerca de 50 cm , para a formação das
cimalhas. Caso o telhado assentasse em vigas pré esforçadas e tijoleira, este
procedimento seria com as vigas do piso de telhado. A utilização de vigamento
em madeira foi uma das más opções que tomei em termos de material utilizado. O
sótão poderia ter sido muito valorizado com a colocação das telhas sobre um
piso de cimento e com isolamento térmico, acrescendo a isso o fato de o telhado
ficar provavelmente mais direito, pois a madeira tem tendência a empenar (a
esse propósito tenho um episódio para contar, mais à frente) e para além disso
há que ter em conta a pouca duração da madeira, quando comparada com o cimento
e outras coisas como maior risco de incêndio, etc. Naquele tempo eram muitas as
carências económicas e a maior parte dos telhados das habitações eram assentes
em vigamento de madeira. Hoje já quase ninguém constrói assim.
Cimalhas formadas com o piso do telhado, num anexo que construí mais tarde. |
Para além do erro cometido
com a utilização de madeira para o suporte do telhado, cometi outro ao não
subir um pouco mais as paredes, após a colocação do teto, pois se o tivesse
feito o sótão poderia ter uma utilização muito mais vasta e prática. Valeu o
fato de ter deixado o telhado com boas águas, ou seja com uma grande
inclinação, o que permitiu que no sótão, na zona do cume, haja espaço
suficiente para permanecer ou circular de pé. Uma boa inclinação dos telhados é
por isso muito vantajosa, até por causa de infiltrações de água em caso de
telhas em mau estado ou devido a grandes chuvadas.
Como se trata de uma
habitação pequena e com uma arquitectura simples, o piso de teto foi bastante
fácil de executar e como as paredes onde assentaram as vigas estavam bastante
próximas, ficando os vãos com cerca de três metros, foi apenas colocado um
tarugo de cerca de 10 cm
(maciço de betão transversal às vigotas) ao centro, assim como foi também cheio
com betão o espaço sobre as paredes de apoio. No final foi colocada uma lâmina
de argamassa de cerca de três cm.
De seguida dei início à
construção das empenas com tijolo de 30x20x15. Aqui cometi mais um erro, pois
poderia ter regulado a inclinação de modo a que não fosse preciso cortar as
telhas junto ao cume, o que infelizmente aconteceu devido à minha
inexperiência, na altura. De qualquer modo, para que a colocação de um telhado
corra bem é indispensável que a casa tenha vindo a ser construída numa
esquadria perfeita e, nesse aspecto, não me posso queixar.
Para as traves do telhado
fui à floresta cortar três eucaliptos, que me pareceram três velas de tão
direitos que eram. Depois de os ter arrastado serra abaixo até ao local de
carregamento para um tractor, com grandes dificuldades, de os trazer para a
obra e depois de colocados no sitio, verifiquei que, afinal, não eram tão
direitos assim, tendo resolvido remover o que estava destinado à trave
principal e fazer uma viga de cimento armado em sua substituição.
Esta viga foi apoiada no cume
das empenas e em dois pilares construídos em tijolo e apoiados numa pequena
viga que abrangia três vigotas sobre o piso de teto. Dadas as condições em que
trabalhava, sem ajudas, foi um grande acréscimo de trabalho e de despesa, mas
foi uma boa opção pois ao menos o cume do telhado ficou direito e assim se tem
mantido ao longo de mais de trinta anos, ao contrário do que acontece em outras
zonas da cobertura.
Chegou a altura de fazer as
cimalhas sobre as empenas, para o que utilizei também vigotas pré esforçadas, o
que fez com que apenas nos cantos fosse necessário o uso de cofragens. Como
trabalhava sozinho, para facilitar esse trabalho das cimalhas regularizei
primeiro as empenas, tendo assentado as vigas directamente em cima das paredes
e, ao encher o espaço entre as tijoleiras, correspondente à largura das paredes
utilizei duas qualidades de argamassa; primeiro uma massa bem forte de areia
lavada e cimento para que colasse ao cimo das paredes e, de seguida, acabei o
trabalho com betão normal para este tipo de serviço. O mais comum e
aconselhável seria ter feito uma cofragem para a regularização das empenas e
depois colocar as vigotas em cima das tábuas e encher tudo ao mesmo tempo com
betão. Como trabalhava sozinho ia utilizando alguns estratagemas para me
desenrascar e, de qualquer modo, nunca tive qualquer problema com as cimalhas.
De seguida, havia que
começar a pregar os barrotes, que neste caso se tratou de eucaliptos com cerca de
10 cm de
diâmetro, que vieram também da serra e foram aplicados ainda em verde, com
casca e tudo, o que também foi errado, pois o eucalipto com casca é mais
facilmente atacado pelo bicho e, por isso e também por uma maior retenção de
humidade, dura menos do que se for descascado. De qualquer maneira, o eucalipto desde que esteja ao enxuto é muito durável, de modo que ainda lá estão e estarão
porque os tempos agora não são propícios a investimentos não absolutamente imprescindíveis.
De ambos os lados do telhado os barrotes assentaram nas cimalhas, em cima das
vigotas, foram pregados às vigas de madeira e, no cume, como a viga era em
cimento encostaram de topo e foram pregados uns aos outros.
Seguiu-se a ripa, também de
eucalipto, que foi pregada respeitando as medidas condizentes com o tipo de
telha a utilizar, o que também deve ser considerado na construção das empenas
de modo a evitar o corte das telhas. Como os barrotes eram algo irregulares, o
pregamento da ripa teve de ser feito utilizando uma linha de modo a ficar
certa, sendo necessário, por vezes, utilizar calços debaixo da ripa ou, noutros
casos, efectuar desbastes nos barrotes.
A forma como devem ser assentes os cumes. Fonte da imagem |
Num telhado simples de duas
águas, como era o caso deste, a colocação das telhas, se a casa estiver em boa
esquadria e a ripa tiver sido pregada corretamente, não oferece grandes dificuldades,
mas como não tinha tomado as medidas certas na construção das empenas, fui obrigado
a cortar as telhas, junto ao cume, o que poderia ter sido evitado se, como já
disse, tivesse deixado a inclinação do telhado de acordo com as telhas que iria
empregar na cobertura. No cimo das telhas, junto ao cume, normalmente
utiliza-se uma peça designada por tamanco assentando-se depois os telhões ou
cumes, com argamassa, mas eu por uma questão de economia e porque os canudos
das telhas eram algo espalmados, não utilizei essas peças de remate. De notar
que os cumes devem começar a ser colocados do lado para onde o vento sopra mais
frequentemente de forma a evitar o mais possível a infiltração de água das
chuvas.
Normalmente, os ventos fortes
sopram de sul para norte arrastando assim a chuva nessa direcção, sendo necessário
por isso um bom isolamento das paredes e coberturas virados a sul, no entanto,
nos telhados ou partes de telhado voltados para norte, há uma menor incidência
de sol no inverno e uma maior acumulação de geada e gelo, o que provoca uma
deterioração mais rápida das telhas, sendo por isso aconselhável o emprego de
telhas de boa qualidade, resistentes ao gelo. Nesse aspecto não fui muito feliz
e na parte do telhado virada a norte, passados poucos anos, ou talvez mesmo
apenas alguns meses, algumas telhas começaram a lascar-se, o que originou a que
tivesse feito uma reclamação junto do fornecedor, que contactou a fábrica, que
por sua vez enviou um técnico ao local, tendo ficado acordado que me dariam uma
palete com 300 telhas para substituir as peças degradadas prematuramente. Como
as telhas a substituir nessa altura andariam à volta de 50, as restantes
ficavam para resolver futuros problemas que surgissem com outras e também como
pagamento pelo trabalho de substituição. De então para cá outras telhas se
degradaram e agora o telhado pelo menos essa parte terá de ser renovado, pois
encontra-se em bastante mau estado, no entanto, do lado sul, mantém-se em
estado razoável.
Aspecto do telhado, notando-se do lado direito, que é a parte virada para norte, uma maior degradação das telhas. |
Pequeno glossário de alguns
termos técnicos usados neste artigo:
Cimalha
A parte superior da
cornija. Saliência ou arremate na parte mais alta da parede, onde assentam os
beirais do telhado.
Cofragem
Molde de madeira, cartão,
plástico ou chapas metálicas, utilizado para colocação de betão, de modo que
este mantenha a forma determinada durante o processo de endurecimento.
Cume
Parte mais alta do
telhado, linha de cume, onde se encontram as superfícies inclinadas (águas).
Empena
Cada uma das duas paredes
laterais onde se apoia o pau da cumeeira nos telhados de duas águas; cada uma
das faces dos frontões.
Tamanco
Peça de barro para remate
das telhas junto ao cume do telhado.
Tarugo
No caso citado neste
artigo “tarugo” refere-se a um espaço sem tijoleira, transversal às vigotas que
foi cheio com betão e ferro, para reforço do piso.
Telhões ou cumes
Peças de cerâmica que
fazem a cobertura dos topos das telhas, na parte mais alta do telhado, formando
a linha de cumeeira.
Tijoleira
Também designadas por
abobadilhas, são as peças colocadas sobre as vigotas pré-esforçadas para
formação dos pisos ou placas.
Vigotas pré-esforçadas
São as vigas utilizadas
nos pavimentos, juntamente com a tijoleira, que foram fabricadas com betão e
varas de aço tensionadas, de modo a obterem maior resistência e a poderem ser
utilizadas em grandes vãos.
Artigos relacionados:
Visite a página "Construção Civil", onde estão listados outros artigos relacionados com "construir a própria casa".
Visite a página "Construção Civil", onde estão listados outros artigos relacionados com "construir a própria casa".
Boa tarde Joalex. Casinha já tenho, lá na serra. Um anexo, bem precisava, mas agora é muito complicado meter-me de novo em obras. Quase fiquei «cursada» ao ler este seu post :).
ResponderEliminarSó para deixar um olá e votos de boa tarde.
Verdade, concordo com a Guidinha! Depois dessa publicação a gente já pode até tirar diploma...ahahah.
ResponderEliminarParabéns amigo, como sempre dando aula!