FALANDO DE AGRICULTURA



Esta semana o tempo tem estado óptimo, com um sol radioso, sendo agora a altura ideal para se iniciarem as sementeiras. O verde dos campos irá  dar lugar ao tom castanho das terras lavradas e embora já não seja como antigamente, ainda se nota a azáfama, própria desta época, com muitas pessoas a fazerem o amanho dos seus terrenos. Chegou a altura de, no “Meio Século”, falar um pouco de agricultura.

Fui criado numa aldeia onde a ocupação principal dos habitantes era a agricultura. Esta actividade que era o único meio de subsistência de algumas famílias, ainda hoje ocupa algumas pessoas de mais idade, mas apenas em tempo parcial e, na sua maioria, para a produção de alimentos para consumo próprio. Os meus pais também foram agricultores e eu, que durante a minha juventude sempre me afastei deste tipo de trabalho, embora uma vez por outra os ajudasse nas fainas agrícolas, dedico hoje uma parte do meu tempo disponível a esta actividade, tendo em vista a obtenção de produtos de qualidade para consumo familiar como: batatas, feijão, favas, ervilhas, fruta, ovos e outros. Além da minha chácara, possuo mais algumas pequenas áreas de terreno, onde pratico esta actividade, embora me dedique mais à chácara onde tenho árvores de fruto de várias espécies e também algumas aves de capoeira, para assim poder dispor de ovos de qualidade superior embora, neste caso, não obtenha qualquer lucro, devido às despesas efectuadas com rações.

A sementeira de batatas anual é a actividade mais significativa dos meus trabalhos agrícolas, pois a minha intenção é a de obter este tubérculo em quantidade suficiente para abastecimento da despensa durante todo o ano, o que nem sempre consigo, devido às pragas que atacam a planta, principalmente o míldio, que se propaga mais fortemente com o tempo húmido ou chuvoso. Depois há também a borboleta que ataca o fruto quando já está armazenado sendo necessário fazer um tratamento preventivo com um insecticida, geralmente na forma de pó, o que se torna muito desagradável quando chega a altura do consumo. Para evitar este procedimento é aconselhável, para quem tiver possibilidade disso, armazenar as batatas num sítio fresco e escuro, pois é nos meses mais quentes que existe o maior perigo de contaminação. No meu caso, como tenho aversão ao “pó da borboleta”, costumo recorrer a alguns truques para evitar a contaminação, um dos quais é cobrir as batatas com ramos e folhas de eucalipto, o que nem sempre resulta.

Batatas temporãs, na minha chácara.
Em Fevereiro faço a sementeira temporã da batata, com a finalidade de obter este produto mais cedo, geralmente em pequenas quantidades, pois nesta altura a produção é inferior e não permite o armazenamento por muito tempo, de modo que passados dois meses após a sementeira, já começo a fazer a sua colheita, ao ritmo que se vão consumindo. Neste caso costumo cavar umas pequenas leiras de terra em sítios abrigados, por causa das geadas e, conforme vou cavando um rego, vou tapando o anterior com terra, depois de lá ter colocado as sementes e adubo composto de azoto na forma granulada. No caso da sementeira mais tardia, geralmente em Abril, mando lavrar a terra, trabalho que neste caso é feito com um tractor de média dimensão e depois eu próprio, com a minha moto-enxada, faço a fresagem da terra já lavrada, após o que aplico na máquina uma peça semelhante a uma pequena charrua, com a qual faço a abertura dos regos, separados por uma distância de 0,40 mts., que, após a colocação das sementes e do adubo, são tapados através do alisamento da terra com um ancinho, o que torna esta tarefa mais fácil e leve.

Após cerca de três a quatro meses (dependendo da qualidade da batata e do tempo que fizer), as batatas estão prontas a extrair da terra, sendo este o trabalho mais duro, pois é feito cavando a terra com uma enxada, com a agravante deste trabalho ser feito em pleno verão e com a terra mais seca e dura. Pelo meio está todo um trabalho quase diário de manutenção da cultura, pois é preciso proceder à sacha do terreno e ao arranque de ervas daninhas, regar sempre que necessário e efectuar tratamentos preventivos contra o míldio, de acordo com as condições do tempo, geralmente espaçados por cerca de 10 dias. Também, quando as plantas já atingiram cerca de dois meses de vegetação, se deve proceder à aplicação de um insecticida para eliminar o escaravelho da batateira, que ataca as plantas nesta altura, principalmente quando está muito calor. É necessário ter muito cuidado na aplicação destes produtos, respeitando as regras de segurança, por se tratar de matérias de grande toxicidade.

Há várias décadas atrás quando a lavragem das terras era feita com bois, a área dos terrenos era medida pelo tempo que demorava a lavoura e era comum ouvir-se dizer que: “fulano amanhava um terreno com um quarto de lavoeira, ou sicrano tinha uma propriedade com meio dia de lavoeira”. O dia era dividido em quartos e por isso também os trabalhadores que andavam à jorna por vezes diziam que iam dar um quarto, meio dia, três quartos, ou um dia, consoante o tempo para que eram contratados. Mais tarde com o aparecimento dos tractores as contas da lavoura passaram a ser feitas ao minuto e o trabalho do homem à hora.

Esta texto faz parte do meu livro de língua portuguesa do 1º ano do ciclo preparatório, "Voz da Terra", da Editorial Aster.
Ainda me lembro dos meus pais amanharem um terreno arrendado, junto ao rio Dueça, quando ainda não havia tractores na zona. Para preparar o terreno contratavam um carreiro que tinha um junta de bois, com os quais se lavrava e gradava a terra. Era um terreno com uma área razoável, que levava quase um dia para lavrar. Na altura da lavoura e das sementeiras as refeições eram servidas no campo à sombra das oliveiras. A meio da manhã tomava-se o almoço; por volta da uma da tarde, hora que também se designava por “meio-dia novo”, na hora de verão, era a altura do jantar a que se seguia uma sesta de duas horas. Quando a tarde já ia avançada começava a aparecer um buraquinho no estômago e então atacava-se a merenda. A última refeição do dia era comida em casa, quando o dia já dava lugar à noite e era designada por ceia.

Entretanto começaram a aparecer novas formas de preparar os terrenos de pequena dimensão, passando a ser comum ver pequenos agricultores lavrando as suas próprias terras com pequenos tractores, motocultivadores ou moto-enxadas.

Eu próprio adquiri uma moto-enxada já usada e devo dizer que esta máquina é um óptimo auxiliar não só para cavar a terra mas, no meu caso, sobretudo também para transportar lenhas e todos os materiais agrícolas e de construção. Esta máquina foi para mim de uma importância extrema aquando da construção da minha chácara, pois todos os materiais lá utilizados foram nela transportados.

A frezar a terra com a moto-enxada

A abrir regos


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