John Seymour, escritor, agricultor e
ambientalista, nasceu em Londres em 1914. Ele foi um acérrimo defensor da
teoria da autossuficiência e acreditava que era possível pôr em prática essa
teoria, ou seja: era possível ao ser humano, contando apenas consigo e com a
natureza, atingir a autossuficiência, ou pelo menos alcançá-la em grande parte.
Pessoalmente, não acredito que seja possível a
ninguém, hoje em dia, ser completamente autossuficiente. Neste mundo em que nos
inserimos e em que somos, cada vez mais, dependentes uns dos outros, a
autossuficiência parece ser um conceito utópico, mas também é verdade que para
conseguir-mos sobreviver na orgânica social de um país, em que ter um trabalho
diário remunerado, ou uma reforma, pode não garantir o nosso próprio sustento,
é absolutamente indispensável que tentemos ser autossuficientes em tudo o que
seja possível.
É verdade que o conceito de autossuficiência está
intimamente ligado à agricultura e de um modo geral à produção dos nossos
próprios alimentos, mas a autossuficiência não é só isso; qualquer atividade
que façamos relacionada com a nossa subsistência é uma prática de autossuficiência.
Essa prática da autossuficiência pode ser feita através
do cultivo de produtos agrícolas para consumo próprio, na cozedura do pão que
consumimos, na criação de animais para a obtenção de leite, carne ou ovos, mas
também no conserto do nosso próprio calçado, na reparação de um
eletrodoméstico, ou até utilizando a bicicleta para a maior parte das nossas
deslocações, deixando o carro na garagem. Esta última para além de ser uma
prática de autossuficiência é também uma prática de sustentabilidade ambiental
de grande relevo.
Os trabalhos agrícolas e a criação de animais têm um papel importante na ajuda à autossuficiência alimentar. |
Mas a verdade é que não se pode pensar em ser
autossuficiente, sem fazer trabalhos agrícolas e, consequentemente, sem fazer
criação de animais domésticos. Estas duas práticas estão ligadas e constituem
um dos grandes princípios da autossuficiência: o equilíbrio entre animais e
plantas. As plantas alimentam diretamente os animais; estes alimentam a terra
com os seus excrementos e a terra, por sua vez, alimenta as plantas.
Entre os animais domésticos criados pelo homem,
com vista a obter alguma ajuda no orçamento caseiro, as aves de capoeira ou
mais concretamente galinhas, patos, perus, etc., estarão em primeiro lugar no
número de pessoas a fazerem criações deste tipo, seja porque não é necessário
um grande investimento para começar, seja porque as instalações para essa
atividade podem ocupar menos espaço e serem construídas com facilidade e pouca
despesa.
No entanto, mesmo com um pequeno número de aves,
é preciso trabalhar muito para se conseguir ter algum resultado. Todos os
animais de criação têm o dom de obrigarem os donos a trabalhar, principalmente
na produção do alimento necessário para lhes fornecer. No caso das galinhas
poedeiras, por exemplo, para além de lhes dar os restos da cozinha, terá de
plantar couves galegas e semear milho, entre outras coisas. Não pode pensar em
alimentá-las exclusivamente com rações compradas, porque as galinhas necessitam
de comer muitas verduras e não seria sustentável alimentá-las só com rações,
porque isso seria tão caro que, provavelmente, ficaria mais barato comprar os
ovos.
Claro que os ovos que as suas galinhas põem para
si, não têm nada a ver com os que se compram no supermercado; isso é uma
vantagem e outra é o facto de aproveitar o estrume produzido pelas galinhas
para alimentar a terra da sua horta.
Os seus animais de criação, neste caso as
galinhas, não o obrigarão a trabalhar apenas para lhes fornecer o alimento, mas
também na manutenção da capoeira, como sejam a limpeza de bebedouros e
comedouros e a tirada periódica do estrume e colocação de palha seca, mato ou
feno na capoeira.
Capoeira fixa
Esta abertura da minha capoeira dá para um recinto exterior descoberto e é por aqui que faço a extração do estrume. No entanto tem outra porta para acesso diário. |
Poderá, eventualmente, dispensar o recinto
descoberto e manter as galinhas sempre fechadas na capoeira, mas isso não é
aconselhável porque as aves para se sentirem bem precisam de sair para o
exterior e também necessitam de esgaravatar para procurar alimentos e de comer
erva, muita erva. Isso faz parte da sua natureza e quem cria ou já criou
galinhas sabe bem o quanto elas ficam felizes quando se lhes abre a porta do
galinheiro.
Qualquer pessoa está apta a construir um
galinheiro, o que não é difícil de fazer nem fica muito dispendioso, se
utilizar materiais que se encontrem em desuso e que porventura possa ter
guardados à espera de lhes dar uma utilidade. Se não tiver tábuas usadas poderá
adquirir um tipo mais barato de madeira que se costuma encontrar nas serrações,
normalmente aquelas tábuas mais defeituosas que saem no início e no fim das
serragens dos troncos e que também são designadas por “falheiras”. Quanto às
telhas, com um pouco de sorte pode encontrar quem lhe dispense algumas de um
telhado ao qual estejam a substitui as telhas, ou então comprá-las em 2ª mão a
baixo custo. Ainda recentemente me deram à volta de 500 telhas saídas de um
telhado que estava a ser renovado, que utilizei na minha cabana de troncos.
Se, como disse em cima, a sua exploração
comportar um recinto exterior, a capoeira não precisa de ser muito grande, mas
isso também depende do número de galinhas que pretende ter, se quer criar os
pintainhos ou se simplesmente quer adquirir meia dúzia de frangas já crescidas
para iniciar a atividade.
Na minha capoeira renho sete galinhas e todas põem os ovos neste ninho, feito de uma antiga pipa de vinho. |
Estamos a falar de galinhas de postura e, como
tal, deverá querer ter um número suficiente de aves para, pelo menos, ter ovos
para satisfazer as necessidades da cozinha. Cinco ou seis galinhas deverão ser
suficientes para alimentar de ovos uma família de cinco pessoas, pois as
galinhas poedeiras põe praticamente todos os dias um ovo por dia. No entanto
haverá alturas em que terá ovos de sobra e outras em que terá falta deles,
porque há períodos em que as galinhas põem menos ou até nem sequer põem. Tendo
como base a família de cinco pessoas, se criar um número de galinhas muito
superior deverá na maior parte do tempo ter ovos em excesso e terá então de os
dar ou vender.
Mas pode ser que a ideia seja mesmo essa: vender
ovos.
Essa poderá ser uma boa ideia se tiver quem lhe
compre os ovos e se tiver alimentação para as galinhas produzida por si, de
contrário poderá ser um fiasco. Deve ter em atenção que atualmente a maioria
das pessoas adquire os seus ovos no supermercado a bons preços, em conjunto com
outras compras e a não ser que os venda aos vizinhos, pode ter dificuldades em
fazê-lo. Pela experiência que tenho e eu já crio galinhas há muitos anos, o
melhor é contarmos só connosco e eventualmente com alguns familiares e amigos e
manter só o número de galinhas necessário para essas necessidades. Claro que
isto é apenas a minha opinião, mas ela é apoiada pelo provérbio popular que diz
que “gado de bico nunca fez ninguém rico”.
Operação de limpeza da capoeira. |
Numa capoeira fixa terá que, periodicamente,
colocar algum mato para evitar maus cheiros e também para que as galinhas com
as suas fezes curtam esse mato e o transformem em bom estrume. Depois, em
períodos mais extensos, digamos que de meio em meio ano, limpar e retirar todo
estrume produzido pelas galinhas e colocá-lo no terreno onde irá plantar as
suas couves, as favas, etc. e de seguida fazer uma cama nova às galinhas. Em
cima disse que deveria colocar mato, mas por mato subentende-se que podem ser
ervas secas, agulhas de pinheiro ou até, se tiver uma carpintaria ou serração por
perto, utilizar aparas das plainas, estas últimas mais utilizadas para a cama e
ninhos de pintinhos acabados de nascer. O estrume retirado será a par com os
ovos, o lucro obtido pela sua exploração de galinhas poedeiras.
Capoeira móvel
Se optar por uma capoeira móvel não terá de pôr
mato nem tirar estrume, pois estas capoeiras destinam-se a ser mudadas de local
diariamente. Este diariamente será apenas um modo de dizer, porque apesar de
nunca ter criado galinhas numa capoeira desse tipo, não me parece que quem o
faça a mude de local todos os dias, mas em teoria é isso que se diz.
Também não me parece que seja uma ideia muito boa
andar a mudar a capoeira de local. A única vantagem que vejo nisso é que talvez
seja mais higiénica e evita o trabalho de andar a colocar mato ou feno na
capoeira, mas assim também não produz estrume e, aliás, o facto de ter de andar
a mudar a capoeira de local ainda deverá ser mais trabalhoso. Diz-se que desse
modo as galinhas fertilizam o terreno, mas para isso terão que ser em grande
quantidade. Por outro lado essa fertilização do terreno só tem vantagem se lá
semear ou plantar qualquer coisa e quando fizer isso terá de mudar a capoeira
para outro lado a não ser que vá rodando a capoeira em metade do terreno,
alternadamente.
Acho que essas capoeiras móveis devem ter mais
desvantagens do que o contrário. As galinhas ficam confinadas a um espaço exíguo
e, embora possam estar a pisar todos os dias uma área de terreno diferente, não
terão liberdade para correr e ao mesmo tempo bater as asas como essas aves
gostam de fazer, talvez a imaginar que estão a voar…
E depois essas capoeiras móveis terão de ser
colocadas num terreno bem vedado que impeça a entrada de predadores, pois a
capoeira móvel em princípio não tem segurança e será facilmente invadida por
animais como a raposa ou a gineta, bastando para isso que escavem um pouco na
terra.
Seja uma capoeira fixa ou móvel, quem quiser
criar galinhas como ajuda à autossuficiência alimentar, deve tentar construí-la
da forma mais económica possível. Se fizer um investimento muito grande
provavelmente o retorno desse investimento demorará muito tempo a chegar, se é
que alguma vez chega. Ainda me lembro de quando há quatro ou cinco décadas
atrás se faziam galinheiros utilizando apenas algumas varas de acácia,
dispostas em triângulo e com espaços de quatro ou cinco cm entre elas.
Gastavam-se apenas alguns pregos que era o único material que se comprava,
sendo as dobradiças da porta feitas com as solas de uns sapatos ou de uns
chinelos velhos, solas essas que às vezes já estavam furadas de tantos
quilómetros feitos nos pés dos donos.
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